A paz que esconde violencia

Na Bahia, Nordeste do Brasil, a justiça local aprovou que os setores que recebem e julgam os casos sobre violência doméstica e familiar passem a se chamar agora de Vara da Justiça Pela Paz em Casa.

Essa mudança acontece exatamente no mês em que se completa 11 anos da implementação da Lei Maria da Penha (11.340/2006), sem dúvida, uma das leis mais famosas no Brasil. Ela traz como questão central a responsabilização do Estado em relação à violência contra a mulher, pautando mecanismos preventivos e repressivos da violência cotidiana, conseguindo trazer à ordem do dia essa pauta que antes era invisibilizada como assunto pessoal, como briga de marido e mulher.  

A Rede de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres de Salvador reagiu. Em nota publicada convocando o  movimento para ampliar as ações de base contra a nomenclatura elas pontuaram que “o poder legislativo poderia ter estabelecido outra terminologia para denominar os atos atentatórios cometidos contra as mulheres no ambiente doméstico e familiar, mas adotou o termo violência. Poderia ainda a lei estabelecer outra nomenclatura para as unidades judiciárias onde devem tramitar os processos de violência doméstica e familiar contra a mulher, ou não nomeá-las, como tantas outras leis não o fazem, mas estabeleceu desde o seu artigo primeiro que se denominariam Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher”, escrevem em sua nota. 

Este é um ataque material e simbólico. A Lei Maria da Penha além de definir o nome das Varas de Justiça, salienta que, para a efetiva proteção das mulheres, é preciso existir uma rede de serviços ampla, articulada, bem equipada, com profissionais qualificados e que tenham compreensão de que a violência de gênero tem características e aspectos muito particulares, que requerem uma intervenção especializada.

Entretanto, como pontuado pela Articulação de Mulheres Brasileiras, em nota lançada referente ao 11 anos da Lei, o que o que temos hoje no Brasil são serviços sucateados, com profissionais atuando em situação de precariedade, sem estrutura e sem suporte para uma intervenção que gere acolhimento e dignidade às mulheres. No último ano, a Rede de Serviços de Atendimento à Mulheres em Situação de Violência diminuiu em todo o país, concentrando-se cada vez mais nas capitais e nos serviços da Segurança Pública e da Justiça. Não há mais investimentos nos Centros Especializados de Atendimento às Mulheres, espaços de referência para o trabalho continuado de cuidado junto às mulheres. Desde o golpe, cada vez mais são reduzidos os recursos destinados aos programas nacionais e aos repasses aos governos estaduais e prefeituras. Enquanto estivermos sofrendo violência doméstica, familiar, institucional e política não teremos paz em casa e nem nas ruas. A violência praticada contra as mulheres é cruel, e não pode ser suavizada em nome de uma falsa paz. 

 

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